quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Viva rápido, morra jovem

Ambientes precários, mães jovens e solteiras, pais criminosos e ausentes, filhos, muitos filhos, que repetem um padrão cruel em uma igualmente cruel roda viva. O cenário é conhecido, mas uma explicação que não se ouvirá por aí é que esse comportamento delinquente é uma resposta às circunstâncias da vida restringidas pela pobreza. Assim começa o artigo que Mairi Macleod escreveu na revista New Scientist de 17 de julho deste ano.

Mamíferos expostos a um ambiente adverso e imprevisível, suscetível a doenças e onde tendem a morrer jovens, adotam uma estratégia de reprodução rápida: amadurecer rápido, dar criar cedo e em quantidade para que se possa garantir a continuidade da espécie antes de adoecer ou morrer. Essa é a proposta de alguns biólogos evolucionistas para explicar um fenômeno que se replica em todo o mundo. Realmente, não é uma explicação trivial e altera a maneira de se tratar o problema.

Analisando os dados coletados em vários países, cientistas checaram se a idade em que as mulheres têm filhos varia com sua expectativa de vida. Os dados encontrados para os seres humanos coincidem com os dados para o padrão geral dos mamíferos: quanto menor a expectativa de vida, mais cedo as mulheres têm filhos. A pesquisa mostra algo que é perceptível em nosso dia-a-dia, os ricos têm uma expectativa de vida maior, procriam mais tarde e em menor quantidade e os pobres, que tem uma expectativa de vida menor, têm um comportamento oposto.

Outro ponto do artigo mostra que em lares onde o pai é ausente e inexiste uma relação saudável entre pai e filha, as meninas tendem a ter relações sexuais mais cedo e em consequência, filhos. nesses ambientes, o pai ou o macho geralmente está buscando sua estratégia de espalhar sua semente em um número maior de fêmeas para garantir sua descendência. A ausência do pai é ainda fonte de outros problemas. Segundo um estudo feito na Inglaterra o envolvimento do pai também têm grande influência no QI da criança e na mobilidade na escala social.

Essas explicações encaixam-se perfeitamente no que vejo nos ambientes mais pobres de nossa sociedade: adolescentes iniciando a vida sexual e gravidez bem cedo; não assumem sua responsabilidade como pais; não formam uma família no conceito tradicional de pai, mãe e filhos; as crianças são criadas pelos avós. Tudo isso como consequência de uma visão de que não há futuro e não há como mudar seu destino.

Minha prima foi professora em uma CIEP próximo a uma favela. Lá as crianças diziam que seu futuro era ficar ali na favela e trabalhar para o tráfico. Essa falta de esperança em um futuro melhor é muito cruel e desumana. Mostra que o problema não é tratado por uma política voltada para educação sexual, por exemplo. Não basta dar palestras sobre anticoncepcionais e distribuir camisinhas em postos de saúde.

A solução passa pela reforma total do ambiente, dando uma melhor condição de sobrevivência, aumentando a expectativa de vida, dando uma visão de futuro. Passa também por educação, emprego, cidadania. Pelo resgate do conceito de família. Enfim, é um problema complexo que não será resolvido por medidas populistas. Não é um problema que se resolva em uma geração. Será necessário um plano de longo prazo, com ações em diferentes áreas. Talvez as UPPs sejam um início, mas não vejo um conceito de política estruturada partindo do governo do estado e isso me preocupa.

"...de uma gente que ri, quando deve chorar e não vive apenas aguenta..."

Milton Nascimento e Fernando Brant